segunda-feira, 28 de junho de 2010

POESIA - Ecos de um prato vazio

ECOS DE UM PRATO VAZIO

Caminhando para a escola pública.
Lembrando
Da mãe doente,
Do chão áspero,
Do caixote com balas para vender na porta do cinema.
Imaginando,
Um prato com comida,
Não muita, não precisa.
Só alguma.
Só comida.
Sentindo
A barriga doendo.
Ainda é tão cedo.
O pé quase descalço tocando o chão,
Frio,
Como o garfo,
Como a colher,
As vezes quente,
Cheinha de arroz com feijão.
O professor lá na frente,
Um montão de números, letras,
Sem sentido.
É difícil pensar,
Muito sono,
Dormindo.
Sonhando um prato cheio,
Uma mãe saudável,
Sonhando roupas bonitas.
Acordo.
A língua seca,
Saliva na mesa.
No caminho para casa
Vejo carros
Bonitos
São os pratos de comida,
Com comida.
A barriga sempre resmungando,
Não dá mais para apertar o cinto,
Não dá tempo para pedir um pão no bar,
A mãe espera,
A fome não.
Vejo a mãe,
Beijo sua testa e digo que foi tudo bem no colégio,
Minto que comí um pão na rua,
Ela diz que guardou um encima da geladeira pra mim.
A geladeira é muito mais alta que eu,
O banco pequeno e pesado,
Os braços fininhos e fracos,
O pão muito duro,
Os dentes cabaleiam.
Sento à mesa e começo a folhear o livro.
Matemática.
Garfos e colheres sobre a pia,
Secos e cinzas.
O prato de lata no armário.
Meus olhos clamam e meu estômago ruge em silêncio.
Ouço os ecos vindos do prato vazio.
Eles machucam a barriga,
Os ouvidos
E apertam o coração.
Os ecos nunca acabam.
Quem me dera eu pudesse comê-los.
Me sinto fraco.
Os olhos fecham e tombo sobre o livro.

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